Do Lixo

25 de mar. de 2008















Guilherme Castro


Estava quase terminando. Agora, era só recolher o lixo com a pá, despejar na lixeira, e estaria tudo pronto. Poderia, enfim, descansar. Suspendeu o tapete, juntou o lixo com muito cuidado, recolheu com a pá. Mas de repente, antes que pudesse fazer mais algum movimento, ouviu a voz, vindo debaixo:
- Que vida desgraçada essa minha. Sempre engolindo lixo. Nada mais. Lixo, lixo e lixo. Não me usam para guardar doces ou jóias. Apenas lixo. A minha vida é comer lixo, do meu nascimento até a minha morte. E quando morro, pra onde vou? Para o lixo!
Assustou-se ao perceber que era da lixeira que vinha a voz. A princípio, pensou em correr o mais rápido que pudesse. Mas permaneceu num estado de calma. Com algum custo, conseguiu responder:
- Mas é pra isso que servem as lixeiras. Pra se colocar lixo dentro. É absurdo pensar em se guardar doces em uma lixeira! Você não possui esse direito. E a culpa não é minha!
Em um tom levemente irônico, a lixeira retrucou:
- Engraçado você dizer isso. Minha função é engolir lixo. Eu não posso guardar nada além de lixo, porque foi pra isso que fui feita, você diz. Agora pense comigo: Falando de funções e direitos, me parece que o ser humano não foi feito para comer lixo. Essa é a minha função, certo? Então porque há tantos de sua raça se alimentando do lixo que devia ser meu? Com que direito o fazem?
O silêncio pairou sobre as duas criaturas. Após alguns minutos, colocou o lixo na lixeira, que não falou mais, e se retirou para concluir alguma outra tarefa importante.


1 comentário(s):

Wesley Viana disse...

Humor reflexivo!