Londres, algum lugar no futuro
Alexandre acorda assustado.
Novamente a noite foi repleta de pesadelos. Ele olha ao redor para ter certeza
de que está em casa. Sua mão faz um gesto e aciona à distância o teclado
virtual do computador. O relógio tridimensional é projetado acima da cama, são
dez horas da manhã. Alexandre aciona outro botão e inicia a programação do
café-da-manhã. Ao chegar à sala um holograma é acionado; é sua mãe: “ filho,
seu pai e eu fomos à casa de sua avó, retornaremos ao anoitecer. Hoje é
domingo, divirta-se.”
Alexandre já não se incomodava mais com os conselhos de sua
mãe para que se divertisse. Ele tinha acabado de completar quinze anos e não
fazia nada que os adolescentes comuns costumavam fazer. Os amigos de Alexandre
gostavam de utilizar o simulador de realidade para várias coisas. Nos finais-de-semana eles o usavam para jogar, desde futebol até simulações de aventuras
espaciais. Desde criança, Alexandre era diferente. Frequentemente, ele parava
durante uma determinada situação e olhava ao redor, observando. Quando o
perguntavam, ele dizia que tinha a impressão de que aquilo já havia acontecido
com ele antes, ou que ele já havia estado naquele lugar. Mais tarde ele
descobriu que aquela sensação se chamava deja-vu.
Alexandre foi aos poucos se
tornando mais isolado, seus amigos de infância se distanciaram. Todos achavam
que ele era autista, inclusive seus pais. Alexandre, por sua vez, não fazia
questão de amigos, ele achava as pessoas simplistas demais, conformistas,
presas em seus mundinhos fechados. Ele gostava de ler, era o melhor aluno da
escola, embora fosse indisciplinado e irônico com os professores. Acabou
fazendo alguns amigos, mas nunca houve uma amizade profunda e verdadeira.
Enquanto eles usavam e abusavam do simulador de realidade, Alexandre gostava da
realidade em si. Nas férias, ele gostava de ir aos poucos reservatórios
ecológicos da Inglaterra e procurar espécies de plantas e animais praticamente
extintos. Na escola, as sensações de deja-vu se aprofundaram. Durante as aulas
de história, Alexandre sentia como se nomes e lugares históricos estivessem relacionados
a ele, era como se algum dia ele tivesse estado naqueles lugares e era uma
sensação maravilhosa. Porém, algumas coisas o assustavam.
Os pais de Alexandre
chegaram a achar que ele era esquizofrênico, pois desde os oito anos de idade
ele comentava que era perseguido por homens estranhos que o vigiavam,
comunicando -se entre si, como se estivessem vigiando seus passos. Seus pais
chegaram a informar a policia e a contratar seguranças. Mas, a própria policia
acabou abandonando o caso dizendo que se tratava da imaginação do menino e os
seguranças, estranhamente, desapareciam ou pediam demissão e nunca mais eram
vistos. O pior é que a medida que Alexandre crescia, ele tinha a impressão de
que as perseguições aumentavam, que ele era vigiado durante todo o dia.
Alexandre decidiu então compreender o que estava acontecendo. Ele sabia que
para alguém com seu nível de inteligência não seria difícil descobrir; ele
estava enganado. O que ele encontrou foi uma teia de mistérios e conspirações
governamentais, lendas urbanas e artigos ridicularizados pela imprensa. Havia
algo grande sendo encoberto, um segredo compartilhado por todas as nações do
mundo, como um pacto de sobrevivência. Alexandre passou a dedicar sua vida a
essas pesquisas. Ele descobriu vários códigos secretos na Internet que nenhum
hacker comum seria capaz de descobrir. A cada descoberta ele ficava cada vez
mais aterrorizado e extasiado ao mesmo tempo. Como a humanidade desconhecia
todas aquelas informações? O que aquilo tinha a ver com ele?
O último pesadelo que Alexandre
teve antes de acordar naquele domingo não foi como os outros. Ele costumava
sonhar com o passado, mas dessa vez ele sonhou com o futuro, como se algo
estivesse predestinado a acontecer com ele. No seu sonho, havia uma um
artefato, semelhante a uma cápsula. Ele não conseguiria pesquisar esse assunto
em seu computador particular. Alexandre tomou o café, deletou a holomensagem de
sua mãe, pegou seu skate magnético e foi direto à ciberbiblioteca de Londres.
Durante o trajeto ele observava os pedestres, homens e mulheres, pois já havia
se acostumado a ser observado pelos espiões que, discretamente ligavam seus
chip-celulares depois que ele passava. Ele começou a achá-los ridículos. Será
que achavam que ele não percebia? Porém, durante os últimos dois dias,
Alexandre não percebeu ninguém o vigiando. Era muito estranho, será que haviam
desistido? Será que continuavam o vigiando, mas agora de uma forma eficiente?
Ou pior, será que realmente não era tudo fruto de sua imaginação? Não, ele sabia
que não estava louco.
Ele acessou um dos computadores
da ciberbiblioteca pública, que estava quase vazia. Antes de efetuar o comando
que daria acesso às informações proibidas, Alexandre hesitou e olhou ao redor,
apesar de estar usando o modo “privado” das holomensagens interativas. Seus
olhos arregalaram-se. Ele havia descoberto algo que iria transformar sua vida
para sempre e talvez o mundo.
Continua...